quarta-feira, 29 de janeiro de 2014


há dias que a cabeça dá tilte, o olho arde e o nó aparece na garganta. às vezes vem de brinde o triste sentimento de frustração, como se, ao olhar no espelho, fosse sair uma mão que lhe desse pequenos socos e não hesitasse em dizer: “olha aí, o que você fez”.  ou o que não fez, o  que me parece pior. há dias que o martelo acerta o dedo, o mindinho do pé encontra repetidas vezes a quina da cama e a taça de vinho cai na roupa branca. coisas evitáveis?  talvez, não fosse uma possível tendência ao desajeitamento. de qualquer forma, nessas ocasiões a raiva e dor aparecem quase como um passarinho do relógio de cuco, apenas para dar um olá; e sabemos, não são elas que incomodam - ainda que venham salgar um pouco mais o dia. o que dói mesmo é sentir que nada naquele momento vai dar certo, talvez porque falte criatividade, falte organização, falte principalmente ação, sobre confusão. sentir que nenhuma palavra dita por alguém vai mudar o percurso daquele dia, sentir que as ideias são inofensivas, ficam de molho durante dias, semanas, talvez meses, e quem sabe quanto tempo continuarão por ali. eu tenho pena das ideias inofensivas, essas que cozinham numa panela de pressão sem vapor, porque elas não vão botar medo em ninguém e podem envelhecer, nunca cozer nem sequer sair pra dizer que passaram do ponto. ideias inofensivas ficam guardadas, mas não conversam, não aparecem pro mundo, e quando tentam aparecer, às vezes já foram descobertas por outras pessoas – e, livres, não são mais inofensivas. chegam, acontecem, apavoram. há dias que vem a frustração de perceber que esqueci as ideias na panela, tentando cozinhar, enquanto outros já serviram o prato. então a cabeça dá tilte, o olho arde e o nó aparece na garganta.


T.O.